segunda-feira, abril 16, 2007

Capítulo I – A manhã de um dia diferente (3ª parte)

(...) Um sentimento de embaraço e alívio, misturado com gargalhadas sonoras, ecoou por entre os passageiros. Não chegou a responder. As raparigas entenderam a sua reacção como estando a fazer pouco delas… Mas o riso era tão solto, tão leve, tão natural… que as lágrimas escorriam-lhe do rosto.(...)



Capítulo I – A manhã de um dia diferente (3ª parte)

(...)
Aqueles minutos de riso solto, por momentos assustaram-no… primeiro, porque não conseguia parar e o seu próprio corpo já sentia demasiado a contracção dos músculos… e depois porque tomou consciência que há já muito tempo não ria assim, dessa forma. Com gosto.
Os amigos, há já algum tempo que não o faziam rir da mesma maneira. As conversas. As brincadeiras. Parecia tudo sem sentido. Tão imediato. E quanto mais pensava em si e no mundo… mais triste e isolado ficava. E esse era o verdadeiro motivo de não rir como dantes.
Mais uma razão então para receber e acolher, com agrado e ansiedade, esse momento de extrema felicidade onde foi ele próprio, livre, sem limites, sem restrições. Onde o riso funcionou como um tonificante. Um libertador de espírito, energia e pensamentos.
Continuou viagem. Todas as ideias fluíam a uma velocidade vertiginosa. Viu-se sentado numa montanha russa de pensamentos, onde se encontrava sentado na primeira fila e onde as subidas e descidas eram cada vez mais acentuadas... Aquela era uma montanha russa muito dele… e a altura era tanta que a tal ponto se deixava de ver o solo. Olhou em volta. Todas as pessoas que com ele iam naquela viagem alucinante tinham o mesmo semblante. Impávido. Fechado. Sem angustiar com as vertigens e a rapidez… mas sem viver as emoções e a aventura. “Coitados” pensou… assim deve ser com as suas vidas. Perdido nestes pensamentos, relembrou um cliché, que embora se cubra de sentido, é completamente falso na sua afirmação. “Tempo é dinheiro”. Frase batida mas que quase todos a seguem… demasiado até.
Relembrou as suas memórias de vida recente, sobre as quais tomou determinadas decisões: “agora é altura de concentrar no dinheiro, na carreira, no sucesso…”. Nada daquilo lhe fazia sentido. O que o motiva na verdade são outras coisas. Mas ainda assim algo insiste em martelar a mesma ideia vezes sem conta, até que ele, esgotado e vencido pela exaustão, tem decidido seguir essa atitude. De se fechar também, de ganhar, de vencer, de se vergar ao poder e ao dinheiro como se pão e água fossem. E isso… ao longo dos meses… tornou-o mais egoísta… como todos aqueles para quem o sucesso está à frente de tudo. Os amigos tinham sido esquecidos. Já não o eram de verdade. Apenas conhecidos ou amizades de fachada. Apenas circunstanciais e muitas vezes completamente falhas de conteúdo.
Pela primeira vez naquele dia, reagiu com indiferença à voz que o alertava “É hoje…”. Estava demasiado absorto na sua análise onde se consumia por verificar que se estava a tornar em tudo aquilo que não queria.

(to be continued…)

1 comentário:

Unknown disse...

Espero que as notas auto-biográficas do teu texto não englobem os sentimentos do narrador em relaçao aos amigos. A distância e afastamento dão-nos perspectiva mas não generalizes... Há amigos que continuam a sê-lo e que continuam a gostar muito de ti...